Turbinada por inteligência artificial (IA), uma nova leva dessas máquinas já estão operando, ainda em teste, em empresas como Mercedes-Benz, BMW e Amazon
Feitos à imagem e semelhança de seus criadores, eles são bípedes, têm braços articulados, mãos que manipulam objetos e circuitos que aprendem a tomar decisões. Também têm sensores, câmeras e microfones para entender o ambiente ao redor. Forjados em laboratórios ao longo de décadas, os robôs humanoides começam a chegar aos ambientes de trabalho reais para atuar com humanos.
Segundo o Goldman Sachs, esse mercado deve alcançar US$ 38 bilhões (R$ 215 bilhões) até 2035, com uma redução de 40% no custo atual das máquinas. Desde 2023, os preços de um robô humanoide saíram da faixa entre US$ 50 mil e US$ 250 mil por unidade para algo entre US$ 30 mil e US$ 150 mil.
Essas máquinas inteligentes também poderiam ser a solução para empresas com escassez de mão de obra na manufatura, inclusive a avançada. Robôs que imitam humanos já existem há tempos, mas a inclusão de modelos de IA mais potentes está fazendo a diferença ao aprimorar habilidades, dispensar o controle remoto ou evitar programação constante por um humano. Os humanoides agora têm capacidade de aprender e executar tarefas complexas.

Esther Colombini, professora de robótica e IA do Instituto de Computação da Unicamp, explica que a escolha pelo formato humano não é estética, mas funcional:
— Se a operação acontece em uma estrutura física feita para humanos, posso introduzi-los nesses ambientes sem precisar de adaptações.
A pesquisadora ressalta que robótica e inteligência artificial “sempre andaram juntas”, mas os avanços recentes na IA deram mais capacidade de identificar objetos, reconhecer pessoas e se locomover. Um dos expoentes dessa aliança é o Apollo, humanoide da americana Apptronik, testado desde março pela Mercedes na Alemanha. Com 1,73 metro de altura e 72 quilos, ele transporta kits de peças para montagem de carros de uma linha para a outra.
Plataforma de Hardware
Segundo a Apptronik, a IA permitiu ao robô se tornar uma espécie de “plataforma” de hardware, comparável a um iPhone: ele vem com funções básicas instaladas, mas pode ganhar novas habilidades de acordo com o emprego.
Outras montadoras investem nisso. A BMW adotou em sua operação nos EUA os robôs da Figure AI. A americana Tesla, de Elon Musk, trabalha na fabricação dos humanoides Optimus para atuarem na montadora e fora dela.
A chinesa BYD e a coreana Hyundai, que controla a Boston Dynamics, também têm projetos na área.
A Amazon começou a testar o robô bípede Digit, da Agility Robotics, em galpões dos EUA em 2023. Os primeiros resultados indicam que ele otimiza o movimento de itens e contêineres em espaços complexos, como corredores estreitos e áreas de difícil o para os 750 mil robôs tradicionais que já operam regularmente, diz Thomas Kampel, diretor de Comunicação Corporativa da empresa no Brasil.
Pras Velagapudi, diretor de Tecnologia da Agility, diz que a IA permite que cada unidade do Digit se beneficie do aprendizado dos outros robôs da frota, numa evolução coletiva.
— À medida que esses modelos (de IA) avançam, oferecem a possibilidade de reduzir consideravelmente o esforço necessário para ensinar um robô a realizar uma nova tarefa, um dos principais obstáculos à adoção pelos clientes — afirma o executivo, itindo, no entanto, que ainda há um desafio de confiabilidade em relação à IA.
Além das fábricas, Andréa Janer, CEO da consultoria Oxygen, diz que humanoides avançam em outras frentes, como em tarefas domésticas ou só fazendo companhia, potencializados pela chamada “IA corporificada”:
— Em vez de você interagir por texto ou voz (com IA), você vai ter uma figura que pode te ajudar a resolver problemas. Seria um terceiro o da IA.
Uma das empresas que quer liderar o segmento de robôs “domésticos” é a norueguesa 1X, criadora do Neo Gamma, feito para executar tarefas como aspirar o chão, regar plantas e servir café. Sim, como a robô de avental dos Jetsons. A startup anunciou que começaria os primeiros testes em casas neste ano.
Para Colombini, da Unicamp, a tecnologia ainda está longe da maturidade necessária para humanoides atuarem de forma autônoma e segura em indústrias e residências. Além de desafios operacionais, ela cita dilemas éticos e regulatórios:
— Você confiaria em deixar uma máquina de 70 quilos de metal sozinha com seu filho pequeno ou seus cachorros?
Chineses à frente
Nessa corrida tecnológica, a China parece despontar. No início deste ano, um relatório do Morgan Stanley mapeou as cem principais empresas e setores ligados a toda a cadeia de desenvolvimento de robôs humanoides: 73% das companhias envolvidas estão na Ásia, sendo 56% na China.
“A China continua a mostrar o progresso mais impressionante em robótica humanoide, onde as startups estão se beneficiando de cadeias de suprimentos estabelecidas, oportunidades de adoção local e altos níveis de apoio do governo”, avaliam os analistas.
Assim como aconteceu com carros elétricos e IA, a China incluiu os humanoides em sua estratégia de crescimento. Em 2023, o governo lançou seu primeiro plano específico para a área, com a meta de, neste ano, ter robôs em produção massiva, com “duas a três empresas com influência global”. Em 2027, Pequim quer ter humanoides “profundamente integrados à economia real”.
Entre as principais fabricantes chinesas de humanoides, estão Ubtech, Unitree e Agibot. Há uma semana, 21 humanoides foram colocados à prova (literalmente) em uma meia maratona nas ruas da capital chinesa. Um exemplar do Centro de Inovação em Robótica Humanoide de Pequim venceu a prova de 21 quilômetros em 2h40. Nada mau.
— Os chineses não querem só liderar do ponto de vista tecnológico, mas trazer o robô para um patamar de preço ível. Falam em máquinas de US$ 30 mil até 2030, o que seria um feito enorme — avalia José Rizzo, líder de Industry X na Accenture Brasil.
Por Juliana Causin — São Paulo – O GLOBO